fonte: marcilio reis
Nos Cursos de Formação de Policiais Militares, sejam para a formação do futuro soldado, sargento ou oficial, instrutores ensinam certas técnicas de abordagem a pé, a veículos, a ônibus e a edificação a fim de serem empregadas, quando houver necessidade, no cotidiano de sua atuação. Instruções marcadas pelas orientações minuciosamente detalhadas, categoricamente enfatizadas pelos instrutores através do estudo de ocorrências a nível local, nacional ou até mesmo internacional. Geralmente, analisamos os erros dos outros e correlacionamos com a técnica ensinada para nos servir como lição. Instrutores nos advertem: não façam isso, não façam aquilo, foi precipitação, foi imprudência e uma série de explicações a fim de identificar erros sob a ótica do emprego das técnicas policiais militares. Diante disso, deveríamos observar, ao menos, os princípios básicos de uma abordagem policial no desempenho das atividades de Policiamento Ostensivo. Mas, essa preocupação é demonstrada por parte de algumas guarnições e em casos raros.
Em uma certa Operação Policial, uma tal guarnição com quatro homens, embarcada em uma viatura, estava realizando ronda em certo local, quando resolveu abordar um veículo suspeito e como foi ensinado no Curso de Formação, o Comandante da guarnição seguindo metodicamente o que lhe foi ensinado e o que é previsto nos Manuais de Técnicas e Táticas Policiais Militares ordenou ao motorista do veículo suspeito: “Motorista desligue o veículo, retire a chave do mesmo e a coloque sobre o teto, saia lentamente de costas com as mãos na cabeça…!”. Assim a guarnição realizou todos aqueles procedimentos que chamamos “procedimentos padrão”, observando os princípios da abordagem até a sua conclusão. Ao final agradeceu e explicou ao cidadão o motivo do seu veículo ter sido abordado, já que não foi encontrado nenhum objeto ilícito e o cidadão, além de sentir-se constrangido com todo aquele procedimento, não estava praticando nenhum tipo de crime.
Em outro local, na mesma Operação Policial, outra guarnição com quatro homens, embarcada em viatura, ao abordar um veículo demonstra total descompromisso com as questões técnicas e táticas Policiais Militares. Não se preocupa com a aplicação dos procedimentos e princípios de abordagem, contudo, apesar das carências e deixando de lado princípios indispensáveis, a exemplo da segurança, que é extremamente importante não somente para a guarnição, mas também para o abordado e os transeuntes que passam no local, consideração feita em qualquer polícia no mundo, a abordagem ao veículo é finalizada sem transtornos, sem alterações. Quanto ao cidadão abordado, nada teve a reclamar, já que a guarnição o deixou bastante à vontade para movimentar-se, não colocou as mãos na cabeça e apenas levantou a camisa mostrando que não portava nenhuma arma “na cintura”.
Diante desses dois exemplos hipotéticos, fica a pergunta: qual foi a guarnição que atuou corretamente? Logicamente a resposta da maioria será a guarnição do primeiro exemplo. Isso em virtude desta ter aplicado os conhecimentos técnico-policiais adquiridos na época do curso de formação. No entanto, apesar da resposta da maioria, sabemos que, em virtude da tendência natural do ser humano em relaxar naquilo que faz de maneira constante, e por geralmente o abordado não esbanjar nenhuma reação, a guarnição acaba negligenciando princípios indispensáveis na abordagem. É nesse momento que se abre a porta para que a mídia sensacionalista entre em ação diante de algum erro policial que possa ocorrer. Se não existir um instrumento ou mecanismo para admoestar e orientar constantemente as guarnições antes de saírem para o serviço de policiamento, certamente ele se desenvolverá de maneira semelhante ao segundo exemplo.
Sob a ótica do cidadão desprovido de conhecimentos técnicos policiais, responderá que o correto seria o segundo exemplo. É obvio. Ninguém gosta de ser incomodado. Porém, quando ocorre um erro policial durante uma abordagem na qual a guarnição não encontra uma arma ilegal que estava na posse do abordado, e o mesmo pratica um roubo ou homicídio depois de alguns minutos com a arma que a guarnição não encontrou, em virtude de não proceder de acordo com os procedimentos técnicos de abordagem, esse mesmo cidadão contribuirá com as críticas à ação policial, taxando-nos de amadores e irresponsáveis.
Além disso, o proceder nas abordagens inobservando os procedimentos técnicos, expõe a guarnição a uma série de riscos, tornando-a mais vulnerável a uma reação por parte de um possível criminoso e a desgastes psicológicos na comprovação da legitimidade da ação no que diz respeito a questões judiciais.
Relembro-me de uma conversa com um colega, bastante ligado às questões técnicas policiais, que dizia o quanto é inconveniente fazer parte de uma guarnição descompromissada com as técnicas de abordagem, ao ponto de, aos poucos, sentir-se pressionado a se adequar à maneira de abordar da guarnição para evitar uma indisposição com a mesma. Dizia que fazia parte de uma guarnição do Pelotão Especial que de “especial” somente ostentava o nome. Ficava evidente a carência técnica policial no momento das abordagens.
Assim, diante do exposto, fica a indagação: aonde devem ser feitos os ajustes? O que precisa ser ajustado? Formação Ou interligar as técnicas de abordagem ao interesse e conveniência da sociedade, causando-lhe o mínimo de desconforto, sem a necessidade de colocar as mãos na cabeça, sem a necessidade de sair de dentro do carro e tampouco revistar o seu veículo, seu corpo e suas vestes?
Seja qual for a resposta, seja qual for a saída diante dos diversos caminhos estabelecidos dentro desse labirinto que chamamos Segurança Pública, devemos nos conscientizar que é extremamente necessário demonstrar perícia, qualificação e profissionalismo no desempenho das atividades policiais. É isso que irá nos diferenciar do senso comum, nos imunizará dos problemas judiciais e consubstanciará a nossa condição especial de Policial Militar.
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